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Contando muito, mesmo sem balões

 Os balões de fala são parte fundamental na maioria das historinhas em quadrinhos, sem eles grande parte das historias ficaria sem sentido. Mas alguns autores "fora da caixinha" se desafiam a criar e contar historias sem utilizar desse recurso, sem deixar que o leitor fique sem entender a mensagem.
 Os dois quadrinhos de hoje seguem essa premissa um tanto quanto inusitada: Zonzo e  Sshhhh! , ambos da publicados aqui no Brasil pela editora Mino.

 O primeiro a sair por aqui foi Zonzo do espanhol Joan Cornellà, autor que possui uma legião de fãs nas redes sociais. Esse álbum que chegou aqui em fevereiro do ano passado, é uma compilação feita pelo próprio artista, que separou as suas melhores histórias.



 Humor ácido, violência, politicamente incorreto, infame. São alguns dos termos que acompanham o trabalho de Joan, que retrata personagens felizes passando pelas mais bizarras situações, sempre com um traço muito parecido com o de livros infantis e cores pasteis que ajudam a contrastar com o teor pesado das histórias. O fato de serem histórias curtas e seguirem sempre o padrão de seis quadros iguais, também ajuda no contraste: o enquadramento todo certinho, como enredo "todo errado".



 Não é um quadrinho pra todo mundo, se você é do tipo que se impressiona fácil, religioso, ou conservador, é melhor passar longe desta HQ.
 Isso não quer dizer que o quadrinho se resuma a violência e bizarrice de graça, pelo contrário, em diversas histórias Cornellà cutuca feridas, e aponta diversos problemas da sociedade atual, do seu jeito estranho é claro. 

 Mais recentemente a Mino trouxe outro quadrinista europeu para o Brasil, Jason (isso mesmo, ele assina sem sobrenome). Norueguês, mas vivendo na França, é incrivelmente premiado e sempre citado como referência para grande parte dos quadrinistas atuais (a edição brasileira traz na quarta capa elogios de grandes quadrinistas nacionais: Laerte, Gustavo Duarte, Gabriel Bá e Rafael Coutinho).




  O álbum também é um compilado pequenas histórias, em um mundo de seres humanos com cabeças de animais, que na maioria das vezes deixam o final à merce do leitor.
  Assim como Conrnellà, Jason optou por utilizar um enquadramento clássico, com seis quadros por página pois, segundo ele, esse é um estilo que facilita a pessoa a ter o interesse em continuar a ler aquele quadrinho.
 Jason também explica o fato de ter optado por quadrinhos mudos: a cena de quadrinhos na Noruega não é das maiores, e publicar na língua local talvez restringisse o trabalho dele a um público muito pequeno, com o quadrinho mudo pessoas de qualquer nacionalidade poderiam entender a história que ele estaria contando.



 Esse quadrinho assim como Zonzo, traz algumas reflexões sobre o cotidiano, as relações interpessoais e a sociedade, mas apelando muito mais para um lado sentimentalista e lúdico da coisa. Temas como a relação com a morte, relacionamento pai e filho, romance e outras coisas são tratados lindamente no quadrinho, e as histórias podem ter diferentes interpretações baseadas nas experiencias de cada leitor.

 O universo dos quadrinhos está cheio de experiencias diferentes para os leitores, basta procurar. E é sempre interessante se propor a sair da zona de conforto e optar por uma leitura diferente, o ser-humano naturalmente tem medo do novo, mas é preciso superar essa barreira se quisermos conhecer as diferentes formas em que os quadrinhos (e diversas outras coisas) possam nos satisfazer.
 Espero que tenham gostado das indicações, também estou aberto a indicações e novas experiencias, não tenha vergonha de deixar o seu comentário. Até a próxima.

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